Hoje, ela não via. Não lhe apetecia. Não conseguia. Há dias assim, pensou por instantes. Mas ela odiava abandonar-se à inevitabilidade dos momentos: sempre se recusara a ver a vida passar sobre si mesma, abanando a cabeça em negação quando os outros afirmavam em certeza-absoluta que a existência era como um tanque de guerra desgovernado esborrachando ervilhas humanas. O seu poder de mulher que domina a sua vida puxou-lhe as raízes dos cabelos com força. Obrigada a olhar para dentro, fechou-se na concha. Então, dentro do seu casulo, tomou de novo consciência: há coisas mais importantes, há sementes ainda por cima geradas pela força humana criadora.
O pequeno ser puxou-a para si, deu-lhe um abraço milimétrico e, em sussurro inaudível, disse "não te preocupes, vai correr tudo bem".
Abriu os olhos. As cores, embora ténues, pintavam o mundo de novo.
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