terça-feira, 31 de maio de 2011

o vestido esotérico

Todas as segundas-feiras tenho um curso de Escrita Criativa com a Patrícia Reis. O curso é um prazer porque escrever é-o por essência, para quem como eu gosta de o fazer e aprecia todos os ensinamentos que sobre o acto me possam dar. Mas devo confessar que, neste caso, o prazer maior advém de estar a frequentar o curso acompanhada do meu pai. O meu pai é um orgulho; por ele, pelo que escreve e como escreve (embora ele ainda não o saiba muito bem) e por ser realmente o que o meu filho mais velho descreveria como um pai muito à frente. Na aula de ontem, por exemplo, alguém (bastante mais novo que eu) se queixou da dificuldade de encontrar determinado livro recomendado pela Patrícia. O meu pai levantou o braço e disse simplesmente: 'Eu encontrei na net, se forem à internet, encontram-no.' A frase arrancou-me uma gargalhada, a mim e a mais 30, a Patrícia dedicou-lhe uma vénia. O meu pai é mesmo assim, na sua juventude de 84 anos. Mas o melhor ainda estava por vir; no final da sessão, aproximou-se de mim e disse-me...
- Esse teu vestido é muito... esotérico.
- Achas...? É o meu vestido de Alice (no País das Maravilhas)...
Tinha acabado de responder quando reparei no olhar malandro. Então compreendi que o meu pai estava a chamar-me sexy. É que há coisas que, mesmo pensando, um pai não pode dizer directamente a uma filha.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

o que a idade dá

Dedicada a um livro apenas, enchendo cadernos com letras e análises, assim passei o fim de semana. Aprendi bastante, questionei-me como há muito não me questionava, senti-me pequena por vezes, depois cresci. O que mais me custou? O tempo que ficou mais curto para o miúdo mais pequeno. Mas São Pedro ajudou com a chuva e o recato. Sinto-me mais esperta hoje? Não sei; sei apenas que tenho uma dor de cabeça que persiste desde ontem. Talvez não seja sinal de mais inteligência mas sim da necessidade de uma visita urgente ao oftalmologista. O que a idade dá, a idade também tira.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

quinta-feira, 26 de maio de 2011

virgílio II

Ao final da tarde, a temperatura ainda não tinha caído. A mulher, sentada na esplanada sem carácter da Universidade, virava as páginas como se, afinal, conhecesse o autor; como se o tratasse por tu. Sem dar pelo calor, indiferente ao vai-e-vem dos adolescentes, lia com prazer as palavras que ontem lhe tinham parecido ilegíveis, incompreensíveis, quase censoras da sua própria natureza. Tudo fazia sentido. Mais, chegava a ser interessante. Uma brisa virou duas folhas mais à frente: a mulher percebeu que bastava por hoje. Satisfeita, fechou o livro. A caminho do carro reflectiu em como era engraçada, a sensação. Pela certa devia ser semelhante àquela que sentira na primeira vez que conseguira ler um texto, compreendendo o seu significado.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

virgílio

A mulher olhou para o livro que tinha entre mãos e suspirou: não conseguia passar da terceira página. Não era sono o que o conteúdo lhe produzia e muito menos tédio. Era puro desconcerto, a mulher não estava habituada a não compreender o que alguém, na forma escrita, quereria dizer. Então, pela quarta vez nessa semana, sentiu uma certa forma de desespero, aquela que nos leva a tecer comentários pouco abonatórios sobre nós mesmos. Fechou o livro e negou-se a deixá-los avançar pela auto estima acima. Preferiu reconhecer que não entendia e que talvez precisasse de voltar atrás no autor para algum dia conseguir compreender. Meia hora mais tarde, alguém telefonou, dizendo simplesmente que a iria ajudar.

terça-feira, 24 de maio de 2011

plot

Também gosto desta, embora ache que já vá percebendo o meu plot.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

às minhas amigas do coração

Para todas as minhas amigas que todos os dias dão mais um passo no sentido de se tornarem melhores pessoas. Em especial para ti, Lili.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

mereço

Sabem que mais? Trabalhei que nem uma moura, fiz pelo menos um milhão de coisas além de procurar ser boa mãe, amiga decente, esposa dedicada (bonito!) e ter tempo para mim. Mereço um fim de semana do catatau. Daqueles com praia, e bronzeado a condizer. E mais nada porque nos intervalos, o trabalho continuará. Mesmo durante o fim de semana. Mas, esse, é só para mim. Sejam felizes.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

a duzentos por cento

A mulher abriu a caixa e sorriu. Havia muito tempo que não sentia uma alegria daquelas, quase adolescente. Ela sabia a razão exacta de tanto contentamento. O objecto da caixa era algo que desejara muito. Não era mais uma compra que se faz por impulso (até porque dessas não fazia há muito tempo). Era algo muito querido, algo de que sabia iria tirar todo o proveito, usar até à exaustão, ao mesmo tempo reservando-a no armário com todo o cuidado. Ao pensar no que lhe custara, voltou a sorrir. E depois, agradeceu, repetindo a jura que tinha feito para si mesma poucas semanas antes de que não voltaria a querer ter nada na vida que não desejasse de coração a duzentos por cento.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

amanhã já é quinta!

Mais de 100 e-mails para ler e responder, duas campanhas para finalizar até amanhã,uma nova versão da fábula da lebre e da tartaruga para escrever também para quinta-feira, um trabalho de Psicologia para completar, Virgílio Ferreira para ler e ainda a audição de saxofone do meu filho mais velho. Acham que me sobra energia para mais? Só para o meu marido e o bebé, logo à noite.

domingo, 15 de maio de 2011

maravilha

Amanhã e depois vão ser oito horas de filmagens a tentar recolher emoções de pessoas habituadas a ser sisudas e muito pouco acostumadas ao frio olhar de uma câmara e à parafernália mínima desta actividade. Vai ser cansativo mas tenho a certeza de que quando ambos os dias acabarem, estarei satisfeita. A equipa é excelente, o produtor, o melhor do mundo. E, como se não bastasse, amanhã terminarei o dia acompanhando o meu pai no curso de Escrita Criativa da Patrícia Reis na Casa Fernando Pessoa. Maravilha: mesmo o final de um dia esgotante pode ser usado para sonhar.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

de castigo

Numa das suas "reestruturações", o blogger resolver apagar o meu post de ontem. Obra do acaso? Talvez. Não gostei. Por isso hoje recuso-me a escrever mais aqui, ficou de castigo.

quinta-feira, 12 de maio de 2011

gratidão

Tinha recebido boas notícias, vários e-mails com carinho desinteressado, entrevistara uma pessoa para trabalhar consigo da qual gostara bastante, as crianças estavam felizes. Percebeu que com tanta coisa a esta hora do dia só lhe restava sentir-se grata. Fechou os olhos, fixou a atenção num qualquer lugar imaginário dentro de si e simplesmente agradeceu.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

pedacinho de gente

Ela gostava especialmente destes momentos que se repetiam noite após noite. O miúdo punha a chupeta na boca, agarrava os seus amigos do sono, fechava a porta do quarto, e dizia 'Histo'ia". Ele escolhia o livro, sentavam-se ambos no cadeirão, ele no colo dela. O miúdo apontava o título com o dedo indicador, minúsculo, a deixa certa para a leitura se iniciar. E então ela começava a ler, muitas vezes a mesma história de todas as noites, outras vezes uma nova, ou ainda uma outra que tinha ficado esquecida por algum tempo. A mulher adorava aquele momento em que o tempo se detinha e no qual sentia a criança suspensa pelos acontecimentos do enredo, suspensa das suas palavras, das suas pausas, o calor do seu corpo pequenino contra o dela, a mão direita levemente pousada sobre a sua enquanto virava as páginas.
O miúdo ainda é muito pequeno mas a mulher sabe a velocidade em que as coisas se tornam passado. Por isso não consegue prescindir destas noites, é-lhe muito difícil ter de o fazer. Porque ela sabe. Sabe que aquele pedacinho de gente muito depressa virará gente grande, e mais difícil será tê-lo ao seu colo para lhe ler uma história. Mas sorri. Porque no fundo também sabe que, para ela, ele será sempre isso, um dos seus pedacinhos de gente. E isso, nem ele lhe poderá tirar, nem quando alcançar mais de um metro e oitenta de altura.

terça-feira, 10 de maio de 2011

wisdom

(obrigada Carlos.)

segunda-feira, 9 de maio de 2011

a conspiração do universo

"Quando uma criatura humana desperta para um grande sonho e sobre ele lança toda a força da sua alma, todo o universo conspira a seu favor".
Goethe

(Lindo. lindo. lindo. lindo. Por favor lembrem-se disto... pelo menos até ao final desta semana.)

sexta-feira, 6 de maio de 2011

e...











... bom fim de semana, se não nos virmos antes.

storycorps, a não perder

"StoryCorps is an independent nonprofit whose mission is to provide Americans of all backgrounds and beliefs with the opportunity to record, share, and preserve the stories of our lives. Since 2003, StoryCorps has collected and archived more than 30,000 interviews from more than 60,000 participants. Each conversation is recorded on a free CD to share, and is preserved at the American Folklife Center at the Library of Congress. StoryCorps is one of the largest oral history projects of its kind, and millions listen to our weekly broadcasts on NPR’s Morning Editionand on our Listen pages.

We do this to remind one another of our shared humanity, strengthen and build the connections between people, teach the value of listening, and weave into the fabric of our culture the understanding that every life matters. At the same time, we will create an invaluable archive of American voices and wisdom for future generations.

In the coming years we will build StoryCorps into an enduring institution that will touch the lives of every American family."


(Foi o meu filho Tomás quem me apresentou a este mundo extraordinário da StoryCorps. Uma bofetada de luva branca para todos aqueles que ainda acham que os adolescentes de agora não se importam com valores como a humanidade, o cuidado com os outros, a proximidade, o respeito ou... o Amor. Obrigada Tommy.)

quinta-feira, 5 de maio de 2011

quarta-feira, 4 de maio de 2011

reset

Olhou em volta. O escritório era um terço do tamanho do anterior. No entanto, as suas coisas estavam lá, o que interessava tinha permanecido, aquilo que representara o passado e o fechar de um ciclo tinha ido embora, deitado num caixote verde ou azul, oferecido a alguém, reconduzido para uma sala qualquer.
Olhou em volta. A luz era o triplo da que gozara no local anterior. Sorriu: 'Como diz o João, na nossa vida é bom fazer resets'. Isso mesmo. Sair da zona de conforto, confrontar-nos a nós mesmos e reinventar a vida, como donos dela que somos.

terça-feira, 3 de maio de 2011

a reclamação dos outros eus

A mulher olhou para os 6 livros que comprara na Feira e sorriu: O Sapo Apaixonado e O Sapo e o Vasto Mundo, ambos de Max Velthuijs, Nome de código:Leoparda, de Ken Follet, Milagrário Pessoal, de José Eduardo Agualusa, A cidade sitiada, de Clarice Lispector, Manhã Submersa, de Virgílio Ferreira. 'Cada um de nós é mesmo mais do que um', pensou. Assinou os livros com o seu nome e data como fazia sempre, e inspirou profundamente tentando acalmar as mil e uma outras personalidades dentro dela que reclamavam por outros autores.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

a vida em cheio

As duas mulheres começaram a manhã tratando de si mesmas, por entre risos, comentários ligeiros, palavras que eram desnecessárias porque as trocas de olhares diziam tudo, e elogios que apenas as amigas verdadeiras sabem dizer de forma desinteressada. Fizeram um intervalo e concederam o almoço aos maridos de ambas e ao filho mais novo de uma delas; mas apenas no tempo quanto bastasse para poderem retomar a partilha. De volta ao carro, e ao tempo que queriam que fosse apenas o da sua amizade, rumaram à Feira do Livro. Quando a tarde acabou, estavam ambas carregadas de livros novos e de um dia bem cheio. Cheio das coisas simples que alimentam a vida de verdade.