sexta-feira, 28 de junho de 2013

sem touca



Um pouco mais desarranjada, bastante mais cansada, não tão aprumada mas com uma imensa vontade de que chegue o fim de semana, haja paz e bons banhos de mar. Sem touca, evidentemente porque a perfeição só é perfeita numa fotografia.

quinta-feira, 27 de junho de 2013

sem ar

O pipo está quase a rebentar. Hoje é melhor não dizer mais nada.

quarta-feira, 26 de junho de 2013

paciência?!

Sentada numa das inúmeras esperas da Loja do Cidadão, a mulher leu umas páginas do livro. Geralmente tinha uma capacidade de abstracção bestial; mas hoje, os pings e os pongs dos números das senhas tiravam-lhe a concentração. Ainda faltavam trinta antes do seu e a ela restava-lhe apenas uma hora, antes da tarefa seguinte. Deu por si irritada e esse estado trouxe-lhe à memória os demasiados acontecimentos de uma manhã apenas: o passeio matinal, o desencontro ao chegar a casa, a multa pesada a caminho do consultório, a otite cerosa do miúdo, os trinta-e-muitos-graus, a irmã mais velha que mais uma vez partia, deixando um vazio pequenino. Ping. PIng. Ping. Ping. Os números ganharam velocidade no écran e de súbito, a sua vez chegara, como que por milagre. A mulher suspirou: talvez valesse a pena ter paciência. A verdade é que a paciência era o seu exercício diário dos últimos dois anos; não lhe trouxera melhor forma física, mais paz ou arremessos esotéricos de serenidade. Será que a paciência dela ainda aguentava ter de exercer mais paciência? Merda para a paciência.

terça-feira, 25 de junho de 2013

madiba

Hoje, na CNN, pode ler-se: Nelson Mandela in critical condition days before Obama visit.
Custa-me muito pensar que este homem possa desaparecer. Um dos últimos e raros símbolos da ausência de ódios, da capacidade de perdão e reunificação da diversidade pode estar prestes a deixar-nos. Não nasci na África do Sul mas conheço o país no terreno e na história, que devorei como uma leoa, em especial nas partes relativas a Nelson Mandela. O equilíbrio do país é, em grande parte, o legado deste homem. Esperemos que o seu coração aguente e que a sua alma não deseje descansar ainda. 

segunda-feira, 24 de junho de 2013

lilliput


A mulher não viu a lua ontem e teve pena. Valeu-lhe a lembrança daquela vez, inesquecível, numa ilha maravilhosa chamada Vieques, onde assistiu, deitada no chão de cimento à beira de uma piscina incrível, a uma das maiores chuvas de estrelas daquele ano. Ter a dimensão da nossa importância pequenina no meio de tamanha grandeza faz-lhe sempre bem. Fá-la sentir-se parte de algo maior, mesmo sendo diminuta como um Lilliput.

(obrigada Carlota por esta imagem)

quinta-feira, 20 de junho de 2013

só mais um bocadinho

A cabeça começa a dar sinais de distracção. Os olhos desviam-se com frequência do computador e olham para o céu. O corpo pede calções, bikini e sandálias, desejando evasão. Ja cheira a férias. Mas ainda falta um bocadinho. Aguenta mais um bocadinho, rapariga.

quarta-feira, 19 de junho de 2013

quarta-feira, 12 de junho de 2013

alice


Deixo-vos com esta até segunda. Esta Alice vai de ponte para a praia das maravilhas.

terça-feira, 11 de junho de 2013

seth globepainter

Seth Globepainter é um street artist do Cambodja. Desconhecido para mim até agora, momento em que passei a ser fã. Belo começo de semana curta.




sexta-feira, 7 de junho de 2013

gente pequenina

O miúdo acorda às sete e quinze. Às oito está a caminho do colégio. Entra às oito e trinta, aprende até às dezasseis, com almoço, sesta e lanches pelo meio. Às dezasseis e quinze retorna a casa, brinca até às dezanove e trinta, toma banho e janta. Às vinte e uma horas ouve uma história e cai em sono profundo. É assim desde Setembro, cinco dias por semana. E eu ainda comento por que é que ele anda irritadiço. Chama-se estar farto, mesmo na linguagem dos quatro anos. Farto da rotina, farto das aulas, ansioso pela fase do fazer-o-que-apetece a que vulgarmente se dá o nome de férias. Eu sei que é a vida, que será cada vez mais duro e também mais enriquecedor daqui para a frente. Mas muitas vezes pergunto-me se não obrigamos esta gente pequenina a ser gente grande desde demasiado cedo.

quinta-feira, 6 de junho de 2013

impressão


Philippe Pasqua, um dos mais impressionantes artistas que vi nos últimos tempos. Quase street art que me deixa sem palavras.

terça-feira, 4 de junho de 2013

a luta

A mulher acorda e o pescoço gane. Gane o pescoço, gane o braço direito, ganem as costas. O lado preguiçoso da mulher diz não vás, vais ficar pior. A parte teimosa da mulher levanta a família inteira, veste o mais novo, espicaça o mais velho, prepara pequenos almoços, nos intervalos ainda veste roupa confortável para o passeio. O lado preguiçoso zanga-se: não vês que tens o pescoço avariado?! A teimosia vence, a família sái para a escola e a mulher sái atrás deles, caminhando vigorosamente. Os primeiros metros são penosos, a preguiça pica, duvida, envenena. A mulher defende-se e respira, respira, lembrando-se das palavras dos professores de Pilates: usa a barriga para respirares, pescoço e costas têm de ficar livres, como se nada tivessem a ver com o resto. Depois do primeiro quilómetro, a mulher dá um pontapé valente á preguiça e de súbito esquece-se; esquece-se do pescoço, das costas, do braço, esquece-se que tem corpo, como se fosse apenas barriga e respiração. Quando dá por ela, passaram seis mil metros e está de volta a casa. Vencera a luta.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

aventura no bloco operatório

O senhor meu pai teve hoje mais uma aventura no bloco operatório. Depois das anteriores que lhe rejuvenesceram o coração e lhe devolveram a vida, vestiu novamente o seu chapéu de explorador e as botas dos campos de África, e lançou-se a vencer mais um desafio do corpo: duas hérnias silenciosas que teimavam em dificultar-lhe a vida, impedi-lo de andar vigorosamente; em suma, duas espertas que procuravam restringir-lhe a mobilidade, como se quisessem provar-lhe os seus oitenta e seis anos. Tão enganadinhas. O senhor engenheiro pode ter essa idade na morfologia mas no resto é mais ágil que muitos jovens, mais desperto que muitos executivos, mais activo que a maioria dos supostos atletas urbanos. Assim sendo, caçou as duas, meteu-as num frasco, deitou-lhes a língua de fora e até foi capaz de pedir que não lhe dessem anestesia geral porque não quer perder a memória. O senhor meu pai pode ter algumas cicatrizes mas leva-as com jeito, como recordações da vida que sempre quis: uma vida cheia, vivida nas mãos, nos olhos e em tudo o que guarda não em objectos mas nas células invulgarmente inteligentes do seu cérebro, e em cada poro da pele, também. O meu pai comove-se em silêncio com as coisas pequeninas; esse é o brilho da valentia que nunca acaba nos seus olhos.