sexta-feira, 29 de abril de 2011

o segredo é amar

O segredo é amar. Amar a Vida
com tudo o que há de bom e mau em nós.
Amara a hora breve e apetecida,
ouvir os sons em cada voz
e ver todos os céus em cada olhar.

Amar por mil razões e sem razão.
Amar, só por amar,
com os nervos, o sangue, o coração.
Viver em cada instante a eternidade
e ver, na própria sombra, claridade.
O segredo é amar, mas amar com prazer,
sem limites, fronteiras, horizonte.
Beber em cada fonte, florir em cada flor,
nascer em cada ninho, sorver a terra inteira como o vinho.

Amar o ramo em flor que há-de nascer,
de cada obscura, tímida raíz.
Amar em cada pedra, em cada ser,
S.Francisco de Assis.

Amar o tronco, a folha verde,
amar cada alegria, cada mágoa,
pois um beijo de amor jamais de perde
e cedo refloresce em pão, em água!

Fernanda de Castro, em Trinta e Nove Poemas

(A minha tia Fernanda sabia dizer as palavras desta maneira. Obrigada querida Mafalda.)

quarta-feira, 27 de abril de 2011

para o meu filho Tomás

"Namora uma rapariga que lê. Namora uma rapariga que gaste o dinheiro dela em livros, em vez de roupas. Ela tem problemas de arrumação porque tem demasiados livros. Namora uma rapariga que tenha uma lista de livros que quer ler, que tenha um cartão da biblioteca desde os doze anos.

Encontra uma rapariga que lê. Vais saber que é ela, porque anda sempre com um livro por ler dentro da mala. É aquela que percorre amorosamente as estantes da livraria, aquela que dá um grito imperceptível ao encontrar o livro que queria. Vês aquela miúda com ar estranho, cheirando as páginas de um livro velho, numa loja de livros em segunda mão? É a leitora. Nunca resistem a cheirar as páginas, especialmente quando ficam amarelas.

Ela é a rapariga que lê enquanto espera no café ao fundo da rua. Se espreitares a chávena, vês que a espuma do leite ainda paira por cima, porque ela já está absorta. Perdida num mundo feito pelo autor. Senta-te. Ela pode ver-te de relance, porque a maior parte das raparigas que lêem não gostam de ser interrompidas. Pergunta-lhe se está a gostar do livro.

Oferece-lhe outra chávena de café com leite.

Diz-lhe o que realmente pensas do Murakami. Descobre se ela foi além do primeiro capítulo da Irmandade. Entende que, se ela disser ter percebido o Ulisses de James Joyce, é só para soar inteligente. Pergunta-lhe se gosta da Alice ou se gostaria de ser a Alice.

É fácil namorar com uma rapariga que lê. Oferece-lhe livros no dia de anos, no Natal e em datas de aniversários. Oferece-lhe palavras como presente, em poemas, em canções. Oferece-lhe Neruda, Pound, Sexton, cummings. Deixa-a saber que tu percebes que as palavras são amor. Percebe que ela sabe a diferença entre os livros e a realidade – mas, caramba, ela vai tentar fazer com que a vida se pareça um pouco com o seu livro favorito. Se ela conseguir, a culpa não será tua.

Ela tem de arriscar, de alguma maneira.

Mente-lhe. Se ela compreender a sintaxe, vai perceber a tua necessidade de mentir. Atrás das palavras existem outras coisas: motivação, valor, nuance, diálogo. Nunca será o fim do mundo.

Desilude-a. Porque uma rapariga que lê compreende que falhar conduz sempre ao clímax. Porque essas raparigas sabem que todas as coisas chegam ao fim. Que podes sempre escrever uma sequela. Que podes começar outra vez e outra vez e continuar a ser o herói. Que na vida é suposto existir um vilão ou dois.

Porquê assustares-te com tudo o que não és? As raparigas que lêem sabem que as pessoas, tal como as personagens, evoluem. Excepto na saga Crepúsculo.

Se encontrares uma rapariga que leia, mantém-na perto de ti. Quando a vires acordada às duas da manhã, a chorar e a apertar um livro contra o peito, faz-lhe uma chávena de chá e abraça-a. Podes perdê-la por um par de horas, mas ela volta para ti. Falará como se as personagens do livro fossem reais, porque são mesmo, durante algum tempo.

Vais declarar-te num balão de ar quente. Ou durante um concerto de rock. Ou, casualmente, na próxima vez que ela estiver doente. Pelo Skype.

Vais sorrir tanto que te perguntarás por que é que o teu coração ainda não explodiu e espalhou sangue por todo o peito. Juntos, vão escrever a história das vossas vidas, terão crianças com nomes estranhos e gostos ainda mais estranhos. Ela vai apresentar os vossos filhos ao Gato do Chapéu e a Aslam, talvez no mesmo dia. Vão atravessar juntos os invernos da vossa velhice e ela recitará Keats, num sussurro, enquanto tu sacodes a neve das tuas botas.

Namora uma rapariga que lê, porque tu mereces. Mereces uma rapariga que te pode dar a vida mais colorida que consegues imaginar. Se só lhe podes oferecer monotonia, horas requentadas e propostas mal cozinhadas, estás melhor sozinho. Mas se queres o mundo e os mundos que estão para além do mundo, então, namora uma rapariga que lê.

Ou, melhor ainda, namora uma rapariga que escreve."

(Texto de Rosemary Urquico, encontrado pela Patrícia Reis no blogue de Cynthia Grow. Tradução “informal” de Carla Maia de Almeida para celebrar o Dia Mundial do Livro, 23 de Abril. Obrigada, Pat.)

sexta-feira, 15 de abril de 2011

aviso

Pois. Esqueci-me de avisar: não contem comigo até dia 27 de Abril. Primeiro vou dar um mergulho em mim mesma. E depois, os meus filhos e eu vamos vestir-nos de ovos e esconder-nos por uns dias dos coelhos.

terça-feira, 12 de abril de 2011

dever cumprido

Dever cumprido é a sensação de hoje. É bom. Sobretudo quando o dever é para connosco.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

quinta-feira, 7 de abril de 2011

o adiar do lado

'Sem o seu lado espiritual, você morre', disse-lhe a mulher mais velha. Pois, pensou ela, e quando não há tempo? E quando apenas existe o nosso tempo para esticar, comprimir, diminuir ou mesmo abdicar? Percebeu então que andava a adiar aquele lado há muito, muito tempo. Assustada, teve medo de estar morta e de ainda não ter percebido.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

o desenho

Ao abrir a caixa descobriu um solitário que a mãe lhe oferecera aos dezoito anos e que ela transformara num amuleto para o dedo mais pequenino. Numa viagem de segundos, recordou alegrias, momentos especiais, pequenas aventuras. Decidiu então pô-lo no dedo. Sem que ela fizesse nada para isso, um esboço de sorriso desenhou-lhe os lábios.

terça-feira, 5 de abril de 2011

eat, pray, love

Tenho o livro na estante há séculos, à espera de ser lido. Anteontem vi o filme que andava a piscar-me o olho desde que entrou para o videoclube. Desde aí, posso pensar noutras coisas, mas invariavelmente volto à história e ao que ela me disse. Podem achar que sou pirosa mas fez-me imenso sentido. Se calhar sou mesmo. Ou talvez precise mesmo de uma destas voltas na minha vida.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

saudade

Saiu de casa com um aperto no peito e outro no estômago: odiava deixar o filho mais novo com alguém menos conhecido. Duas horas depois telefonou. O miúdo anunciou ao telefone que estava a chorar. Depois de algumas trocas de carinhos, a mulher desligou a chamada. Continuava com o aperto no peito mas pelo menos o do estômago abrandara: era bom saber que pelo menos agora a criança sabia contar a saudade.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

bom fim de semana

"Viver é a coisa mais rara do mundo. A maioria das pessoas apenas existe."
Oscar Wilde