quinta-feira, 29 de março de 2012

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Até dia 9 estarei assim. Menos séria talvez, com ovos de Páscoa à mistura, mas assim. Até lá.

sexta-feira, 23 de março de 2012

quinta-feira, 22 de março de 2012

h2o

Entrar na água azul transparente e cálida. Mergulhar membro a membro devagarinho, gozando cada milímetro de sal na pele. Sentir o calor nos ombros. E finalmente submergir a cabeça. Silêncio. Paz. Peixinhos de todas as cores em volta.
A água é sempre minha salvadora. Mesmo se apenas na imaginação.


quarta-feira, 21 de março de 2012

banalidade

Pois. Pode ser uma banalidade mas nunca é demais celebrar a chegada da Primavera. Pelo menos para mim. Vejo flores em todo o lado e juro que não é por tomar substâncias ilícitas. Nunca tomei nem tomarei. Já tenho a imaginação suficientemente fértil. Até que enfim chegou a Primavera. É muito bom sentir-se Primavera.

terça-feira, 20 de março de 2012

dedicatória



O meu parque de estacionamento é paredes-meias com as filmagens de uma longa metragem de época, produzida por franceses, que todos os dias nos presenteia com personagens em descanso, fumando cigarros, jogando às cartas. É como voltar ao passado por momentos. 
O meu parque de estacionamento tem arvores altíssimas, velhas e sábias como a vida, e flores pujantes que agora fazem questão de deitar os seus aromas cá para fora como se competissem pelo prenúncio da Primavera.
Todos os dias, estaciono o carro no Jardim Botânico. É um verdadeiro privilégio ter um parque de estacionamento assim.

segunda-feira, 19 de março de 2012

contar uma vida

O tema era a história de vida do miúdo de três anos.
No dia anterior, o homem e a mulher recortaram, colaram e pintaram, chegando finalmente a uma figura desenhada da criança, repleta de fotografias, imagens e ilustrações que significavam o contar do seu trajecto neste mundo. No dia seguinte, os três chegaram à escola e o miúdo inchou de orgulho quando a professora desenrolou o cartaz. Depois, diante dos amiguinhos, a mãe contou uma história que era a história dele, dela e do homem, usando os ingredientes de um conto, desde o era uma vez, e passando por todos os mistérios e fantasias que podem bordar uma vida com detalhes de prender a atenção. Os miúdos escutaram em silêncio e no final bateram palmas. O rapazinho cresceu mais dois centímetros. E a mãe, para não parecer lamechas, esperou até chegar ao carro para finalmente se poder comover com o reviver de uma dádiva chamada filho.


sexta-feira, 16 de março de 2012

um bónus dos deuses

A minha mãe está bem. Tudo não passou de um susto, uma brincadeira de mau gosto ou um fazer chegar à terra de um aviso dos senhores lá de cima para que se dêem atenção às coisas que verdadeiramente importam na vida. Não te posso dizer mais nada, não consigo dizer mesmo mais nada, apenas respirar o alívio depois deste aperto na alma.

A mulher imaginou palavras de alento do outro lado, uma certa forma de colo e tomar conta. Depois, desligou o telefone imaginário e praticou um acto inimaginável para ela: comprou um bilhete de lotaria. Este bónus dos Deuses merecia ser celebrado.

quinta-feira, 15 de março de 2012

a nossa educação

Acordou. Pela fresta da porta do quarto viu a luz da escada. O miúdo acordara? Já? Sem ela servindo de despertador? Levantou-se e espreitou. O rapaz, vestido, deu-lhe os bons dias, desperto. Ficou contente e ao mesmo tempo meio tristonha, devia reconhecer. Todos os dias via o crescimento dos filhos. Ela sabia onde este conduziria. Era o sentido das frases que escrevera Saramago: os filhos não são nossos, nunca o serão, faz parte da nossa educação saber deixá-los partir. Mas não era por isso que não doía nem que fosse só um bocadinho massacrado pelo orgulho e razão.

quarta-feira, 14 de março de 2012

verborreia

Sentada à mesa com os dois filhos, ela aproveitava o contacto com os dois, na refeição do dia possível em conjunto. Na sua família, as refeições sempre tinham sido algo importante. Eram os momentos de partilha, do acertar de agulhas. Com os seus pais e irmãos, ela tivera o privilégio do almoço e jantar diários. Nestes tempos mais modernos e na cidade, apenas o segundo era praticável sendo por isso para ela, sagrado.
O miúdo mais velho contou como correra o teste de História, descrevendo as perguntas e a forma das suas respostas. Orgulhosa, ela ouvia, o miúdo mais novo brincando com a sopa mas atento ao discurso do irmão. O adolescente fez uma pausa e então a criança de quase três anos discursou, elaborando um parágrafo enorme, incompreensível, na sonoridade imitando as palavras do irmão. Riram os três. Quando o jantar terminou, os miúdos concordaram que ela não iria fazer mais nada e arrumaram os pratos. A mulher comoveu-se de tanta plenitude.

terça-feira, 13 de março de 2012

uma enorme vitória

Sentada no avião, a mulher apertou o cinto de segurança, engoliu as culpas e decidiu que aqueles quatro dias, mesmo se vividos em conjunto com outras pessoas, seriam para ela e só para ela. Os dias passaram, quilómetros de conversas sucediam-se de forma interminável mas ela conseguia, conseguia reflectir em simultâneo, despejar a cabeça, fazer uma viragem que era no fundo uma nova viagem dentro de si mesma. As religiões do dia eram apenas os momentos em que ao telefone matava a saudade do marido e dos filhos; tudo o resto era liberdade para dentro, mesmo se ao sabor dos cuidados dos outros ou dos destinos dos outros. Na última manhã, ao despertar, compreendeu que aquela fora mesmo uma viagem muito além da distância física: era a primeira vez que vivera o direito de se ausentar e que as culpas não eram disfarçadas mas antes banidas. Pela primeira vez, considerou-se uma boa mãe e uma boa companheira pelo simples facto de se permitir o seu próprio espaço. Essa era uma enorme vitória.

quinta-feira, 8 de março de 2012

até dia 13, olharei apenas por mim


acelerada

Acelerada, é o termo. Hoje não consigo mais que isto. E a lista ainda não chegou ao fim.

terça-feira, 6 de março de 2012

correr para quê

Faltavam vinte minutos. 
A mulher, meio-vestida, meio-maquilhada, meio-calçada, ouviu o bebé a chorar à porta. Desceu. Como tantos outros desejos das crianças, o miúdo pretendia levar para a escola o seu prato verde berrante de plástico com quatro bolachas Maria. Era importante, quase como se transportasse uma escultura nas mãos pequeninas. Tentou distrair a sua atenção. O bebé teimou, as lágrimas saltando dos olhos em repuxo quase de desenho animado. O pai olhou para o relógio e, sem mais delongas, tirou o prato das mãos dele, pegou-lhe ao colo e saiu para a rua. Choro e lágrimas redobraram e o coração quebrou quando o ouviu chamar por ela. Meio-vestida, meio-maquilhada, meio-calçada, correu para a rua, deu-lhe um beijo e voltou para dentro. Odiava que ele saísse de casa assim.
O telemóvel apitou. 
Faltavam apenas dez minutos.
A mulher voou escadas acima, retocou a pele e os olhos, penteou-se, vestiu-se com o preceito da circunstância, ligou o alarme, fechou a porta e arrancou no carro como se não tivesse mais tempo de vida.

Trinta segundos depois, foi obrigada a parar: um camião enorme bloqueava a rua. Dois homens descarregavam mercadorias com uma calma imensa, imunes ao stress dos automobilistas.
A mulher pensou

De facto, não vale a pena.

Faltavam zero minutos para o encontro no átrio do prédio.
Mas sobravam mais quinze até à hora da reunião.

Para quê corremos tanto?

segunda-feira, 5 de março de 2012

knock out

Há semanas que começam assim. Um a zero, vantagem minha, ou, na gíria do boxe de que tanto gosto, rounds do dia, ganhos por knock out. Venha uma boa noite de sono para calçar as luvas de novo, amanhã.


(maravilhoso grafitti de DOLK)

sexta-feira, 2 de março de 2012

limitless



A mulher ouviu as palavras da outra procurando não se enervar, não a proteger demasiado, não dar conselhos. Afinal, a vida era dela, havia um caminho por percorrer no qual nunca devemos interferir embora nos apeteça tantas vezes mostrar (aquele que para nós é) o lado melhor. A mulher observou a amiga e pensou como ela envelhecera consumindo-se nas teias de si mesma, nas palavras que apenas desejava ouvir, nos enganos onde se enredava. Foi então que disse a única frase possível:

Minha querida, o céu não manda no nosso destino. O céu é o limite para cada um de nós.

quinta-feira, 1 de março de 2012

brincando às escondidas



Chovia.
Mas ela sentia o odor da Primavera no ar, entre as gotas que molhavam o chão sedento, no meio das folhas e flores que pareciam rir-se dos seres humanos aborrecidos pensando no regresso do Inverno.
Chovia.
Mas para ela o que chovia era   Primavera, ou o explodir prazenteiro de uma nova vida em jogo de escondidas com as mentes demasiado racionais das pessoas.


(obrigada Inês, pela imagem)