segunda-feira, 9 de setembro de 2013

viagem

O beija-flor adormecera a bordo. Quando o navio chegou ao destino, o ajustar das amarras provocou um solavanco e o pássaro despertou. Enervado, espreguiçou as asas, esticou as patas diminutas e preparou-se. O olhar dizia-lhe que se tratava de um local desconhecido; o instinto avisou que era melhor escapar. Mas havia um certo perfume no ar. E a luz. O beija-flor levantou o pescoço, era impossível desistir. Voou então depressa, descobrindo um rio de prata, edifícios exagerados de branco por uma luz que se abandonava à reflexão de forma generosa. O colibri redobrou a velocidade e aí descobriu a avenida das árvores mais bonitas que alguma vez havia visto. Aquela era a origem do perfume doce e violeta, como eram violetas as cores das flores que invadiam as árvores. O beija-flor soube então que estava irremediavelmente apaixonado. Pousou. Uma borboleta amarela segredou-lhe o nome; duas penas do seu pequeno corpo mimetizaram de imediato a cor lilás. O insecto avisou que depois do violeta chegaria o verde, e depois do verde, a ausência, o frio. O pássaro não quis saber; afinal, a vida era curta. Levantou vôo, beijou cada uma e todas as flores da avenida e adormeceu. Valia a pena. Em Lisboa, valia sempre a pena o amor.

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