domingo, 8 de setembro de 2013

água doce

Azul escuro. Azul noite. Azul quase negro. Azul profundo. Tinha sido assim a sua noite. A primeira em muito tempo sem se sentir suspensa numa rede delicada e demasiado frágil. A primeira em muitos dias de abandono perfeito ao sono. E porquê? A mulher amava a verdade. Todas as verdades, aliás, das mais bonitas às mais feias, das mais difíceis às mais fáceis, mas sempre verdade. A falta dela tornava-a rouca, tirava-lhe a capacidade de cantar, um aperto insuportável no peito instalava-se e a única varanda possível era a que lhe permitia mergulhar no mar. Da verdade. Hoje, a mulher era a sobrevivente de um mergulho consciente que a levara até às mais escuras profundezas, sem sombra de quaisquer medos porque era por si, tinha sido apenas por si e estava consigo. Inteira.
Na metáfora perfeita dessa noite, retirou do corpo pequenos pedaços de algas de todas as cores e acariciou as queimaduras dos vários corais de fogo. Passou os lábios pela pele dos braços e, ao sentir o sal, pensou que era o momento. Chegara o momento merecido de um beijo de água doce e macia. Um beijo longo. Para sempre.

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