quarta-feira, 4 de março de 2009

Anjos na Terra

Entrou nas urgências e deu o nome. Uma enfermeira, mulher feita, de aspecto vigoroso (só podia mesmo chamar-se Amélia) aproximou-se e disse

- Ouvi que é a A., não é? A Doutora disse-me para a receber; vou já tratar de si.

Amélia olhou para ela, observou a mala kingsize e reforçou com o ar duro-terno de quem já viu muita coisa

- Não a quero de pé. E pouse-me essa mala no chão; só espero que não esteja pesada.

A paciente sorriu, sentindo-se reconfortada com o tom de comando.
Depois, não esperou nem dez minutos. Quando deu por si já estava de CTG na barriga, identificando pulsações e comportamento do ser que tinha lá dentro. A enfermeira percebeu a existência de contracções, deitou-a numa maca e pespegou-lhe com frasco e meio de soro

- Para ver se esse bebé se acalma.

Depois veio a médica, com o mesmo sorriso de sempre, o profissionalismo que lhe conhecia há mais de 12 anos. Virou-a do avesso com ternura e mãos firmes, e finalmente mandou-a ter juízo e descansar

- Para ver se esse rapazinho aguenta mais uma semana e a leva para um hotel de cinco estrelas.

Saiu bem disposta, segura e a desejar encontrar aquela equipa todinha se o miúdo resolvesse sair mais cedo. Mais uma vez não percebia os comentários negativos que muitos faziam da Maternidade. Certo era que ela não fazia o género maricas, sabia ser paciente fácil de médicos e hospitais. Aliás, tinha mesmo tolerância curta para mariquices, reconhecendo à légua o esgotar fácil da sua pachorra diante daqueles a quem tudo dói ou cujas maleitas são sempre piores que as dos outros.
"Que maravilha..."
Pensou,
"Que maravilha descobrir verdadeiros Anjos na Terra."
Existem mesmo. São mais do que se imagina. E ainda por cima são daqueles que tratam de nós sem prometer salvação eterna em troca de bom comportamento.

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